quarta-feira, 17 de outubro de 2007

pega um, pega geral e também vai pegar você.

acabo de retornar do cinema em plena quarta-feira (sim, um dia que eu dedico ao meu ofício exercendo atividades culturais porque, todo mundo sabe, os jornalistas estão sempre trabalhando ainda que para os meros mortais não iniciados nessa arte isso possa parecer puro entretenimento. invejem-me.) quando tive o imenso prazer de assistir "tropa de elite", que causou um bafafá danado ao vazar e ser vendido de forma "pirata" nos camelôs do rio mas que confirmou todas as minhas expectativas (e que, certamente, compensou a minha espera de alguns meses para vê-lo no telão!).

quando, há um tempo atrás, comentei em família minha grande vontade de assistir o filme, a primeira reação foi de espanto. acredito que minha mãe foi a mais "chocada". se bem me lembro, as palavras dela foram algo parecido com: "como alguém pode querer assistir um filme tão violento como esse? a gente vai ao cinema pra se distrair!" e, para muitos e muitos leigos, essa é uma opinião válida. a verdade é que eu, ana fonseca, não sou assim tão apreciadora da sétima arte quanto muitos compatriotas meus (que, infelizmente, acabam assistindo muito "besteirol" nas telonas com essa desculpa esfarrapada de que "é entretenimento".) e, portanto, me dirijo às salas de reprodução quando há um fortíssimo interesse de minha parte. e o filme "tropa de elite", desde o primeiro "disse-me-disse", me chamou atenção.

não, eu não gosto de ver desgraça tanto quanto qualquer um de vocês. mas a experiência de assistir um filme como esse (que, aliás, não sei se pode ser categorizado porque, sinceramente, até hoje não assisti nada igual.) é perceber que nós, pessoas daqui de baixo e de carne e osso, fugimos afoitamente do que acontece de verdade do lado de fora das nossas casas. o BOPE não é invenção cinematográfica. o BOPE é real. e o BOPE sobe a minha rua pela contramão para chegar até a entrada do morro dos macacos. e o BOPE fecha a minha faculdade em dia de operação no morro do turano. agora, será que eu e você sabemos de verdade o que é o BOPE além dessa "tropa" de homens que, segundo uns, matam sem dó e nem piedade e, segundo outros, garantem a "segurança" da cidade do rio de janeiro?

o BOPE é cotidiano, mas um cotidiano para o qual nós fazemos vista grossa. um cotidiano que nós taxamos de "os caras de preto que sobem o morro pra matar os outros". um cotidiano que a gente empurra para debaixo da mesa e continua a vida como se ele simplesmente não existisse. e, por muitas vezes, nós esquecemos que o BOPE existe por nossa causa. e que, além de tudo isso, cada integrante do batalhão é um ser humano como a gente que arrisca a vida.

mas o grande questionamento do filme não é como se porta um oficial do BOPE ou se ele se utiliza de métodos que ongs e a ONU reprovariam para cumprirem suas missões. o grande questionamento, ao meu ver, é que as pessoas que mais temem, criticam ou torcem o nariz para os "homens de preto" é que são os maiores responsáveis pela existência deles. o problema é que muita gente entra com a cabecinha pequena na sala de cinema, muita gente entra achando que vai ver polícia matando bandido, muita gente entra pelo simples prazer de ver um filme numa tarde qualquer e esquece que todo filme é também reflexão. então surgem todas as formas de idolatria ao "capitão nascimento" (personagem do excelente wagner moura, melhor ator do brasil na atualidade, na minha humilde opinião.) sem que se perceba que muita gente que repete fervorosamente suas falas financia o que faz nascimentos, matias e netos tomarem parte nessa guerra.

rio de janeiro, abre os seus olhos! o BOPE não é digno de idolatria. eu não ponho minhas mãos no fogo para dizer que eles são a tropa honesta da polícia. e eu não assino embaixo dos métodos e das atitudes que um "capitão nascimento" tem quando sobe o morro ou desce de caveirão, trazendo o espólio de guerra. eu simplesmente digo que muita gente que não vive essa realidade é que a financia. e, para mim, essa é a questão chave de "tropa de elite". e eu posso dizer isso tranqüila porque eu sou vítima da estupidez alheia.

ao invés de irmos ao cinema e sairmos de lá com o sonho de sermos do BOPE, que saiamos com o exemplo dos "aspiras" honestos que apenas queriam fazer bem seu trabalho, que acreditavam em segurança e justiça. que saiamos do cinema não achando que a solução é "matar bandido", mas tendo a certeza que se isso tudo existe é porque muito jovem de classe média e alta paga o preço. que saiamos da sala de cinema sabendo que ali no BOPE não existe nenhum super-herói, que são todos de carne e osso como eu e você e que, assim como nós, eles também temem a morte. a morte que muitos de nós colocamos em seus caminhos.

no fim das contas, cativante. e, acredito eu, todos deveriam assistir.