lembranças laváveis.
será plena a felicidade que digo que sinto? faz tanto tempo e deixei as ondas levarem os restos do que, um dia, foi combustível, foi heroína, foi sangue, foi fogo e foi luz. daí adotei essa postura, de quem tem jeito de que é feliz e sorri, a cada instante, por qualquer vibração nova que capta no ar. fiz de conta que, a cada passo, estou mais perto do que me fortalece, seja lá o que isso for. mas às vezes me pego, olhar distante vagando vadio naquele horizonte infinito que eu cismo em aproximar. são letras de música que batem e rebatem. são bolas, são bolhas, são sopros da vida que expulsei de mim e que se recusa a morrer, fica voltando na cabeça e, às vezes, escancara a porta do coração. não avisa mesmo. vem, vai, faz o que quer e acontece. depois passa, vai embora de mansinho, como quem nunca quis nada. é só lembrança que, agora, acho que já está fria. já se foram os dias de quentura e de choro no travesseiro amigo. hoje é só sensação que incomoda. é como farpa que entra no canto da unha. fica lá, agoniando. se mexe o dedo assim ou assado, cutuca. e se não mexe, ou mexe pra uma direção diferente, nem parece que o bicho se entrevou ali de jeito. é como se nunca nem tivesse existido. um pontinho na grande reta que é a vida. e, bem, pontos são tão pequenos... quando queremos que sejam, é claro. às vezes isso é grande como um ma...stodonte! (a gente aprende a se corrigir a tempo, vejam só!) e na sua sutileza de paquiderme nada gentil, se aloja fazendo pesar o que já era leve, era pluma pairando no ar. eu acho graça quando isso vem e me toma de jeito. lembranças não são "laváveis". e, no pano da memória, elas ficam lá manchadinhas que só. não é ruim. às vezes pode ser até um pouco desagradável, pode fazer a gente sentir falta do que a gente deixou no vento. mas, muitas vezes, faz a gente perceber que viveu e aprendeu. acho que é daí, da segunda opção, que eu tiro que estou feliz. na verdade, estou satisfeita com algumas coisas que aprendi a meu respeito e a respeito do meu próximo, seja ele quem ele for. mas, bah, como ainda é complicado lidar com umas malditinhas que gostam de doer feito espinho de rosa fresca do jardim da avó... só que, um dia, a rosa murcha e o espinho vai junto. é com o tempo, claro. é com o tempo que as coisas ficam velhas, as folhas caem e o coração sossega, desassossega por outro, sossega de novo... e por aí vai. um ciclo. uma vida inteira.
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ouvindo: o vagabundo - engenheiros do hawaii.
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ouvindo: o vagabundo - engenheiros do hawaii.